"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 1 de outubro de 2016

PROZAC NO CAFEZINHO

Para analistas, perda de fôlego da inflação abrirá espaço para queda forte dos juros

Ao se levar em conta as estimativas de inflação, Produto Interno Bruto (PIB) e resultado nominal das contas públicas, os analistas ouvidos pelo Banco Central esperam um céu de brigadeiro para o Brasil nos próximos quatro anos. Alguns chegam a prever um futuro para lá de animador. Com base nas projeções, é possível deduzir que esses analistas do mercado financeiro esperam um comportamento mais que exemplar dos parlamentares brasileiros, embutindo nos números para as principais variáveis macroeconômicas a aprovação praticamente intacta de medidas importantes do ajuste fiscal, como a proposta de emenda constitucional (PEC) que limita o crescimento dos gastos públicos à variação da inflação do ano anterior, e de reformas, como a da Previdência.

Na pesquisa semanal Focus, divulgada pelo BC, a mediana das estimativas dos analistas para o índice oficial de preços ao consumidor, o IPCA, para 2017 é de 5,07%, enquanto que para 2018, 2019 e 2020, a projeção é de 4,5%, ou o centro da meta de inflação. No Relatório Trimestral de Inflação (RTI), publicado na terça-feira, o BC prevê no cenário de referência (levando-se em conta um dólar a R$ 3,30 e uma taxa Selic a 14,25%) que a inflação em 2017 será de 4,4% e apenas 3,8% em 2018. Para os analistas, a perda de fôlego da inflação abrirá espaço para uma queda forte dos juros: a Selic deverá encerrar 2017 a 11%.

Os economistas do banco Itaú estão entre os mais otimistas. Eles projetam um crescimento do PIB de 2% em 2017 e de 4% em 2018. Para o Itaú, a inflação deve subir 4,8% em 2017, levando o BC a cortar os juros básicos para 10% no fim do ano que vem. Há ainda os mais confiantes no ciclo de corte de juros: o banco BNP Paribas espera uma taxa Selic de 9,25% ao fim de 2017. Será que tamanho otimismo é justificável?

Não faz tanto tempo que a dinâmica da dívida bruta brasileira gerava alarme entre analistas e investidores, especialmente no auge do pessimismo no governo Dilma Rousseff, levando a projeções mais altas de inflação e menor espaço para queda dos juros básicos. Muitos chegaram a dizer que, se nada fosse feito para uma redução estrutural dos gastos públicos, o Brasil caminhava para se tornar a Grécia, que ainda sofre as consequências de uma situação de insolvência fiscal. O que mudou efetivamente para essa mudança de visão sobre o horizonte macroeconômico brasileiro? O que foi aprovado desde que Michel Temer assumiu a presidência para endossar, de fato, as projeções de inflação e juros em queda e de crescimento mais acelerado da economia?

Os analistas ouvidos na pesquisa Focus esperam uma queda do déficit nominal de 9% do PIB em 2017 para 6% do PIB em 2020. Boa parte disso é em razão da expectativa de redução da Selic pelo BC, uma vez que o déficit nominal reflete as despesas com juros da dívida e também o resultado primário, ou seja, o que o governo consegue poupar antes de pagar juros. O banco Safra, por exemplo, estima que a dívida bruta brasileira saltará de 73,8% do PIB em 2016 para 79,7% do PIB em 2017. Em 2013, estava em 51,7%. Já o banco Société Générale, num cenário base de crescimento econômico moderado e de inflação e juros baixos, estima que a dívida bruta atingirá 104% do PIB em 2024. Mas os analistas do banco francês alertam: se o governo brasileiro fracassar em controlar a situação fiscal no médio prazo, esse porcentual baterá em 152% do PIB em 2030.

Com essa trajetória da dívida bruta, é possível prever que a inflação caminhará para 4,5% de forma sustentável nos próximos quatro anos e que haverá espaço para um corte agressivo da Selic até o fim de 2017? Todavia, apenas se o Congresso aprovar a PEC dos gastos com um prazo de vigência de 20 anos e, além disso, uma reforma da Previdência mais ampla (idade mínima de 65 anos, unificação dos sistemas público e privado e desvinculação dos benefícios do salário mínimo), o otimismo hoje faz sentido. Mas em 2012, quando as projeções para 2016 entraram na pesquisa Focus, os analistas chegaram a prever crescimento acima de 4% do PIB e inflação de 4,5% para este ano – mais longe do que se caminha a realidade impossível!



01 de outubro de 2016
Fábio Alves, Estadão

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